12 de fev. de 2013

Trecho do artigo: COTA RACIAL PARA O ENSINO SUPERIOR: DISCRIMINAÇÃO OU INCLUSÃO SOCIAL – NAÇÃO MULTIRRACIAL

LEGISLAÇÃO BRASILEIRA DE PROTEÇÃO AO HIPOSSUFICIENTE E O POSICIONAMENTO DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL Conforme visto no capitulo anterior, por meio das ações afirmativas o Estado sai de sua inércia e promove ações para garantir a proteção a grupos fragilizados na sociedade.

Também foi esclarecido em momento anterior que esta hipossuficiente pode trazer uma falsa ideia de que tal proteção será dirigida a um grupo minoritário, mas que a necessidade de proteção do Estado pode ser oriunda de outras razões.

 Neste capítulo serão apresentados alguns exemplos em que mesmo não representando uma minoria numérica, diferentes grupos na sociedade passaram a contar com especial proteção.

 Cita-se como exemplo as leis trabalhistas, que visam garantir maiores condições de defesa dos direitos dos trabalhadores, mencionando-se como mecanismos o Jus postulandi, o Princípio da proteção, o Princípio do in dubio pro operário, o Princípio da norma mais favorável, o Princípio da condição mais benéfica, o Princípio da primazia da realidade, o Princípio da irrenunciabilidade de direitos, o Princípio da irredutibilidade salarial, da isonomia salarial ou da intangibilidade salarial e do Princípio da liberdade sindical entre outros. No mesmo sentido, a Lei dos Juizados Especiais com os princípios da Celeridade do processo, da Simplicidade das ações e informalidade, da economia processual, da maior ênfase na conciliação e da postulação pela própria parte seguindo critérios definidores. Visando promover a proteção do consumidor, a lei 8.078 prevê de forma expressa em seu artigo 4, I o seguinte: “Este reconhecimento de vulnerabilidade ocorre visto o consumidor ser a parte mais fraca da relação jurídica de consumo. Bem como, encontra amparo na Constituição Federal, à medida que a mesma determina que o Estado regule as relações de consumo, que por sua vez, refere-se à defesa do consumidor, pressupondo assim a real necessidade de proteção”.

Ainda, como ferramenta protecionista, o Código de Defesa do Consumidor prevê a inversão do ônus da prova, a desistência privilegiada pelo prazo de 7 dias sem necessidade de motivos se a compra foi realizada fora do estabelecimento comercial e a facilitação da defesa de seus direitos. Estes são apenas alguns exemplos de relações que contam com o especial apoio do Estado, entre outras como dos deficientes físicos, gestantes, índio, idosos, etc. Oportuno mencionar a fala de Assis (2012): “Os indivíduos são partes de estruturas sociais que tolhem a igualdade de oportunidades. As oportunidades são limitadas em todos os setores da vida social, principalmente para as classes sociais de baixa renda. A posição de classe introduz o individuo em organizações diferentes. Assim, uma posição elevada permite sua admissão nos melhores clubes, nas melhores escolas, nos grupos de prestigio etc. Quanto mais elevada à classe social onde a pessoa se situa, mais e melhores oportunidade esta pessoa terá.” (ASSIS, 2012. p. 301).

Note-se que o autor não coloca cor de pele como um fator determinante como limitador de oportunidades, mas faz menção expressa às classes sociais de baixa renda, o que parece o mais adequado. Desta forma o Estado se vê como defensor de direitos mínimos a integração social de determinado grupo. Tais questões, quando levadas à luz do poder judiciário, são garantidas por meio de tutela obrigatória em observância as características do grupo necessitado. Sobre esta analise de admissibilidade estatal, Mendes (2011) vai mais longe, esclarecendo que “Em relação aos direitos sociais, é preciso levar em consideração que a prestação devida pelo Estado varia de acordo com a necessidade especifica de cada cidadão”. (Mendes, 2011, p.668).

Assim, trás como um dos aspectos necessário ao reconhecimento da hipossuficiência a real necessidade do cidadão individualmente, assim como em classe ou grupo. Temos pelo poder legislativo um esforço evidente para implantar o regime de cotas, seja por acreditar que se trata de uma necessidade, seja para transferir uma incompetência Estatal que não tem conseguido suprir a demanda com um ensino público em quantidade suficiente e de qualidade. A seguir, seguem legislações em torno desta temática, bem com o posicionamento adotado pelos Tribunais Superiores. LEI 3.708/2001 – ESTADO DO RIO DE JANEIRO Com o intuito de amenizar a diferença entre o número de universitários brancos e negros que frequentam as Instituições Públicas, a lei 3.708/01 do Estado do Rio de Janeiro sob até então governo de Anthony Garotinho visa implantar o sistema de cotas raciais. Esta lei em resumo vem a tutelar 40% das vagas a estudantes negros ou pardos nas universidades estaduais publicas do Estado do Rio de Janeiro.

Tal inovação não passou despercebida, trazendo grande repercussão nacional sobre o assunto, colocando em discussão a constitucionalidade e a justiça desta proteção, além de fartas criticas de parte da sociedade que via nesta legislação uma discriminação racial inversa. Colocando de lado a questão da constitucionalidade da referida lei, observe-se que uma lacuna de ordem prática torna sua aplicabilidade bastante questionável, pois, afinal de contas, como se verificar quem é negro ou não num pais tão rico em diversidades étnicas? Esta lacuna gerou inconveniente, já que as soluções adotadas foram duramente questionadas, como foi o exemplo da “FILA RACIAL“, “TRIBUNAL DA COR”, além das perguntas às quais os candidatos eram submetidos, de cunho duvidoso em se tratando de racismo inverso. Neste ponto, interessantíssimo trazer o trabalho de campo realizado pelos pesquisadores Maio, Santos (2005). Por ocasião das inscrições, vários aspectos, de notável simbologia, por enfatizarem uma bem marcada separação entre "negros" e os demais, vieram à tona. A vestibulanda Vander Lúcia Fonseca comentou: As cotas já são um bom começo. Só acho constrangedor ter que ser fotografada para provar a minha cor. Já tenho isso registrado em meus documentos. Já Ana Maria Negrêdo frisou diretamente as diferenças de procedimentos: "Acho que os brancos também deveriam tirar foto. Tinha que ser igual para todo mundo. Por que só a gente tem de meter a cara na câmera?" (Inscrição…, 2004). Coube ao fotógrafo incentivar: "Temos que ter jogo de cintura para não deixar a pessoa sem graça, e explicar que é um benefício para ela".

O estabelecimento de filas separadas para as inscrições dos "negros" chamou a atenção. De modo defensivo, declarou o coordenador das inscrições, Neivion Lopes, quanto aos guichês apartados segundo raça: É separado porque precisamos de espaço reservado para fazer as fotos. Uma senhora teria resmungado baixinho: “Isso é constrangedor”. Se a primeira etapa do trabalho de identificação racial da UnB foi conduzida pela equipe da "anatomia racial", a segunda foi conduzida por um comitê de "psicologia racial”. Trinta e quatro dos 212 candidatos com inscrições negadas na primeira etapa entraram com recurso junto à UnB. Uma nova comissão foi formada "por professores da UnB e membros de ONGs", que exigiu dos candidatos um documento oficial para comprovar a cor. Foram ainda submetidos à entrevista (gravada, transcrita e registrada em ata) na qual, entre outros tópicos, foram questionados acerca de seus valores e percepções: "Você tem ou já teve alguma ligação com o movimento negro? Já se sentiu discriminado por causa da sua cor? Antes de se inscrever no vestibular, já tinha pensado em você como um negro?" (Cruz, 2004). O candidato Alex Fabiany José Muniz, de 23 anos, um dos beneficiários da nova rodada da seleção das cotas, conseguiu um certificado comprovando que era pardo ao levar a certidão de nascimento e uma foto dos pais. Conforme seu depoimento, "a entrevista tem um cunho altamente político… perguntaram se eu havia participado de algum movimento negro ou se tinha namorado alguma vez com alguma mulata" (Darse Júnior, 2004).

Dos 34 candidatos que se submeteram à segunda etapa do exercício de "pedagogia racial", 21 deles, antes rejeitados, passaram a ser considerados "negros" pela UnB (Para UnB…, 2004). (MAIO, SANTOS, 2005, p.181) Tais critérios usados como saídas trouxeram evidente constrangimento principalmente a quem já se queijava exatamente do racismo, que passou a acontecer agora com hora e local certos. LEI 5.346/2008 – ESTADO DO RIO DE JANEIRO Após grande repercussão causada pela Lei 3.708/2011, surge a Lei nº 5.346, de 11 de dezembro de 2008, também do Estado do Rio de Janeiro com as características de temporalidade, visto que logo em seu artigo 1º se estipulava a temporalidade de 10 anos.

Esta lei previa cotas, entre outros, para os negros no percentual de 20 por cento, diminuindo consideravelmente o percentual da lei anterior. Esta lei alterou o ponto mais criticado da legislação anterior, ou seja, o método para se definir quem era a pessoa protegida (quais as características seguras de se definir quem é negro ou pardo). De acordo com esta lei, a própria pessoa beneficiária deveria se declarar negro, por meio de simples declaração de cor. Caberia faculdade integralmente o dever de fiscalizar casos de fraude, conforme previsto em seu artigo 1º, §3: §3° O edital do processo de seleção, atendido ao princípio da igualdade, estabelecerá as minorias étnicas e as pessoas portadoras de deficiência beneficiadas pelo sistema de cotas, admitida a adoção do sistema de auto-declaração para negros e pessoas integrantes de minorias étnicas, e da certidão de óbito, juntamente com a decisão administrativa que reconheceu a morte em razão do serviço, para filhos dos policiais civis, militares, bombeiros militares e inspetores de segurança e administração penitenciária, cabendo à universidade criar mecanismos de combate à fraude. (grifo nosso) 

Agora se evita a “Fila Racial”, já que cabia ao candidato honestamente se declarar negro, mas ainda se mantinha o Tribunal da cor, que correspondia a missão dada a integrantes da universidade de analisar casos especiais em que a raça declarada era colocada em dúvida. LEI 10.558/2002 – LEI FEDERAL Nasce com a Lei 10.558 no ano de 2.002, a primeira fonte federal que presta objetivamente a trazer o regime de cotas raciais numa esfera federal. Esta lei anuncia em seu artigo primeiro a criação do programa diversidade na universidade com a finalidade de implementar e avaliar estratégias para a promoção do acesso ao ensino superior de pessoas pertencentes a grupos socialmente desfavorecidos, especialmente dos afrodescendentes e dos indígenas brasileiros. Nota-se que a lei possui a intenção de aumentar a legalidade das leis Estaduais já existentes sobre cotas raciais, visto que em seus artigos não trata detalhadamente do que seria o programa em si.

Por ser a primeira legislação federal e por contar com apenas seis artigos, vale a pena transcrevê-los para melhor ilustrar: Art. 1o Fica criado o Programa Diversidade na Universidade, no âmbito do Ministério da Educação, com a finalidade de implementar e avaliar estratégias para a promoção do acesso ao ensino superior de pessoas pertencentes a grupos socialmente desfavorecidos, especialmente dos afrodescendentes e dos indígenas brasileiros. Art. 2o O Programa Diversidade na Universidade será executado mediante a transferência de recursos da União a entidades de direito público ou de direito privado, sem fins lucrativos, que atuem na área de educação e que venham a desenvolver projetos inovadores para atender a finalidade do Programa. Parágrafo único. A transferência de recursos para entidades de direito privado, sem fins lucrativos, que atendam aos requisitos do caput, será realizada por meio da celebração de convênio ou de outro instrumento autorizado por lei. Art. 3º As transferências de recursos da União por meio do Programa Diversidade na Universidade serão realizadas pelo período de três anos (artigo revogado pela Lei nº 11.507/2007) Art. 4o Fica autorizada a concessão de bolsas de manutenção e de prêmios, em dinheiro, aos alunos das entidades a que se refere o parágrafo único do art. 2o. Art. 5o

Os critérios e as condições para a concessão de bolsas de manutenção e de prêmios serão estabelecidos por decreto. Art. 6o Esta Lei entra em vigor na data de sua publicação. Mas serviu de sinalização clara do posicionamento da união, por meio de legislação de âmbito federal, que abaliza o programa de cotas. LEI 12.711/2012 – LEI FEDERAL Completando a “metamorfose” legislativa em relação a leis sobre cotas, a Presidenta Dilma Rousseff sanciona a lei 12.711 no ano de 2.012, nesta tratando de modo direto, pratico e definitivo por regulamentar no território nacional a politica de cotas raciais em faculdades federais. Em seu artigo primeiro determina a reserva 50% das vagas para alunos que cursaram o ensino médio em escolas públicas, e prevê em seu parágrafo único: “No preenchimento das vagas de que trata o caput deste artigo, 50% (cinquenta por cento) deverão ser reservados aos estudantes oriundos de famílias com renda igual ou inferior a 1,5 salários-mínimos (um salário-mínimo e meio) per capita.”. Este paragrafo único trás objetivamente as cotas sociais, direcionando vagas a candidatos de origem humilde, sem cor de pele, sem região ou religião.

Neste caso, o critério é a questão social que o torna hipossuficiente financeira, garantindo-lhe condição necessária a galgar uma vaga no ensino superior. Entretanto, logo em seguida observam-se as cotas raciais, com a seguinte redação: Art. 3o Em cada instituição federal de ensino superior, as vagas de que trata o art. 1o desta Lei serão preenchidas, por curso e turno, por autodeclarados pretos, pardos e indígenas, em proporção no mínimo igual à de pretos, pardos e indígenas na população da unidade da Federação onde está instalada a instituição, segundo o último censo do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Parágrafo único. No caso de não preenchimento das vagas segundo os critérios estabelecidos no caput deste artigo, aquelas remanescentes deverão ser completadas por estudantes que tenham cursado integralmente o ensino médio em escolas públicas.

Novamente o julgamento de quem é negro é dado à parte que se autodeclara, mantendo-se a insegurança jurídica das legislações antes apresentadas e positivando a diferença entre os necessitados, ou seja, a cor da pessoa humilde será critério de necessidade. Grandes críticas são feitas à solução encontrada pelo legislador, entre elas, o fato de que este seria tão somente um remédio paliativo, pois estaria transferida para o ensino superior uma deficiência existente na base de formação. Isto porque, caso o ensino público oferecesse qualidade em igualdade de condições com o ensino privado, todos os candidatos poderiam concorrer tão somente pelo sistema do vestibular, sem a necessidade de cotas, sejam elas sociais ou raciais. 2.5 ARGUIÇÕES DE DESCUMPRIMENTO DE PRECEITO FUNDAMENTAL N. 186 Os Tribunais também tiveram a oportunidade de se posicionarem a respeito de casos envolvendo a questão as cotas raciais. Para ilustrar os posicionamentos adotados, foram selecionados os casos mais emblemáticos, a iniciar pela ADPF 186. Antes de tratar sobre o caso concreto, alguns esclarecimentos preliminares acerca desta modalidade de controle de constitucionalidade devem ser feitos. A Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental está previsto no artigo 102, § 1º da Constituição e foi regulamentado pela Lei n. 9.882/99. A ação visa à declaração de inconstitucionalidade de atos federais, estaduais e municipais, mas limitando seus debates a violação de preceitos tidos por fundamentais. Neste caso, uma vez proposta a ação, o andamento dos processos judicias ou administrativos que originaram a ADPF permanecem suspensos até que o Superior Tribunal Federal decida a questão. Vale informar que não apenas os atos impugnados permanecem suspensos, mas também todos os demais atos que tratem sobre o mesmo tema. 

Uma vez analisada a ADPF, a decisão possuirá efeito erga omnes, devendo o mesmo entendimento ser aplicado a todas as demais ações sobre a mesma questão, sendo seu efeito vinculante, ou seja, torna-se obrigatório para todos os órgãos judiciais e administrativos que tratarem sobre a matéria no presente ou no futuro. (FERREIRA FILHO, 2012. p. 67) Ainda quanto a ADPF, os ensinamentos são no sentido de que os efeitos de inconstitucionalidade decorrentes de sua procedência poderão “ser restringidas ou ser fixada a data de sua incidência, por decisão de dois terços dos membros do Supremo Tribunal Federal”. (FERREIRA FILHO, 2012. p. 67) Ultrapassados os esclarecimentos preliminares, passa-se à análise do caso concreto. Em 20 (vinte) de julho de 2009 (dois mil e nove) o DEMOCRATAS – DEM, partido político devidamente registrado no Tribunal Regional Eleitoral, ajuizou Ação de Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental perante o Superior Tribunal de Justiça – STF, autuada sob o n. 186-2/800, visando a declaração de inconstitucionalidade de atos administrativos que resultaram nas cotas raciais na Universalidade de Brasília – UnB. Para tanto, indicou como preceitos constitucionais vulnerados: artigo 1º, caput (princípio republicano) e inciso III (dignidade da pessoa humana); artigo 3º, inciso IV (veda o preconceito de cor e a discriminação); artigo 4º, inciso VIII (repúdio ao racismo); artigo 5º, inciso I (igualdade), II (legalidade), XXXIII direito à informação dos órgãos públicos), VLII (combate ao racismo) e LIV (devido processo legal – princípio da proporcionalidade); artigo 37, caput (princípio da legalidade, da impessoalidade, da razoabilidade, da publicidade e da moralidade corolários do princípio republicano). De acordo com os proponentes, aquele era um momento histórico de “verdadeira balburdia jurídica”, pois a incerteza quanto à constitucionalidade da racialização do País, tal como se estava propondo, gerava grande insegurança jurídica. Até aquele momento, mais de 80 Universidades estaduais e federais já haviam implantado o sistema de acesso privilegiado às vagas, o que demonstraria a grande relevância do tema. 

Além disso, grande ênfase foi dada a arbitrariedade quanto ao procedimento para a aferição quanto à raça do candidato, já que, no caso da UNB, esta constatação se daria por um “Tribunal Racial” com amplos poderes para determinar aqueles que podem e aqueles que não podem se beneficiar do sistema de cotas. Apesar do órgão do supremo votar com unanimidade de votos a improcedência do pedido da ADPF 186, eximias foram as justificativas de fatos e recorrente a sinalização de temporalidade. Embora até o momento do encerramento do presente trabalho não ter sido possível o acesso ao acórdão ou aos votos dos ministros, seguem algumas considerações obtidas por meio de notícia da mídia, em especial a eletrônica, conforme elencado nas Referências Bibliográficas. O Ministro Lewandowski, Relator no julgamento: No caso da Universidade de Brasília, a reserva de 20% de suas vagas para estudantes negros e 'de um pequeno número delas' para índios de todos os Estados brasileiros pelo prazo de 10 anos constitui, a meu ver, providência adequada e proporcional ao atingimento dos mencionados desideratos. A política de ação afirmativa adotada pela Universidade de Brasília não se mostra desproporcional ou irrazoável, afigurando-se também sob esse ângulo compatível com os valores e princípios da Constituição. (disponível em , acesso em 08.10.12) Fato curioso no voto do ministro relator é o de que naquela época julgando a justiça das cotas numa proporção de 20% das vagas, uma das razões para o voto favorável foi a proporcionalidade ao atendimento dos mencionados desideratos negros e índios. Neste ponto interessante observar que hoje o percentual para cotas nas universidades publicas é de 50%, o que representa um aumento de 250% na proporção de cotas, se comparada com a Lei 12.711. Estes percentuais demonstram um contrassenso, já que inicialmente considerava-se proporcional a medida de cotas a 20% das vagas, posteriormente alterando-se para 50%. Por sua vez, a Ministra Cármen Lúcia afirmou que: As ações afirmativas não são as melhores opções. A melhor opção é ter uma sociedade na qual todo mundo seja livre par ser o que quiser. 

Isso [cota] é uma etapa, um processo, uma necessidade em uma sociedade onde isso não aconteceu naturalmente." (Disponível em . Acesso em 08.10.12). A ministra reconhece indiretamente a impossibilidade do Estado de garantir os direitos fundamentais do cidadão, não lhes provendo da educação necessária. Para tanto, visualiza nas cotas o remédio a fim de socorrer a falha estatal. Por fim, o voto do Ministro Gilmar Mendes. "Seria mais razoável adotar-se um critério objetivo de referência de índole socioeconômica. Todos podem imaginar as distorções eventualmente involuntárias e eventuais de caráter voluntário a partir desse tribunal que opera com quase nenhuma transparência. Se conferiu a um grupo de iluminados esse poder que ninguém quer ter de dizer quem é branco e quem é negro em uma sociedade altamente miscigenada." (Disponível em . Acesso em 08.10.12). 

Indiscutivelmente, este voto chamou atenção, mesmo porque os votos anteriores vinham apontando o sistema de cotas como remédio para o “doente” social, especificado como negro ou índio. Em sentido inverso o ministro apontou como não razoável o sistema de cotas raciais, afirmando ser o mais indicado um sistema de cotas sociais, pois em um pais que conta com uma miscigenação tal como o Brasil, de fato somente um “iluminado” seria capaz de indicar sem sobra de dúvidas em pode e quem não pode se beneficiar daquele sistema. O cuidado que se deve ter, neste caso, é o de prestar a que a necessita da proteção uma ferramenta útil, sem descriminar o próprio cidadão já tão distante da igualdade. DIREITOS SOCIAIS Feitas as considerações para melhor compreensão acerca das ações afirmativas, suas características e aplicabilidade e ainda, de que forma elas vem sendo utilizadas tanto pelo Poder Legislativo quanto pelo Judiciário em situações que envolvem a proteção por cotas no ensino, cabe agora tratar exatamente sobre os Direitos Sociais. 

Inicialmente cabe observar que direitos sociais são todos aqueles que visam garantir condições materiais ao indivíduo, a fim de lhe assegurar uma existência digna. Para tanto, a tendência é de que se espere que o Estado intervenha na ordem social, estabelecendo critérios de justiça distributiva para diminuir eventuais desigualdades sociais. Em outras palavras, são os direitos disponíveis ao cidadão para que este tenha amplas oportunidades e proteções mínimas compatíveis ao grupo social em que se insere. Tais direitos sociais vem tradicionalmente pontuados nas constituições, com ampliação gradativa: “Como é a tradição de nosso direito desde 1934, a Constituição consagra direitos sociais. São estes direitos a prestações positivas por parte do Estado, vistos como necessário para o estabelecimento de condições mínimas de vida digna para todos os seres humanos. Costumam ser apontados como a segunda geração dos direitos fundamentais” (FERREIRA FILHO, 2012. p.334). Na atual Constituição, os direitos sociais são previstos de forma bastante ampla no artigo 6º: Art. 6º. São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. Conforme constatado, os direitos sociais visam garantir a qualidade de vida a serem preservados pelo Estado, que se utiliza do aparelhamento estatal para o exercício do controle social por meio de normas jurídicas, conferindo competência para autoridades, legitimando-as para uso força para tutelar as condições sociais para o pleno desenvolvimento do cidadão com qualidade de vida. Assim, o Estado resguarda alguns direitos básicos que se classificam num grupo maior como sendo direitos sociais, podendo-se destacar o direito a educação, saúde, moradia, trabalho e uma remuneração digna, igualdade, direito a cultura e o próprio direito a vida (sendo este o principal direito). Neste panorama, é imprescindível haver um equilíbrio com outros direitos para sua qualidade plena, sob pena de afetando não só o homem, mas também os que os circulam. Cada direito social tem sua característica, mas de igual compartilham a importância que os faz juntos o sonho da vida social completa. Nesta oportunidade analisam-se as cotas sociais no ensino superior publico, desta forma aproximamo-nos do direito social a educação. Embora utopicamente a previsão constitucional seja de exemplar beleza, o que se tem observado é que o Estado não consegue suprir todos os direitos elencados no artigo 6º. Seja em razão do sobrecarregamento do Estado, seja por sua gestão ineficiente, o fato é que ele não tem conseguido entregar de forma adequada todos os direitos sociais ao cidadão. Assim, vários daqueles serviços e direitos inicialmente atribuídos ao Estado acabam por ser privatizados, como é o caso da Educação. Neste sentido, o artigo 205 da Constituição Federal prevê: Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Conforme se observa, trata-se de dever do Estado e da família a educação. Entretanto, com a escassez de vagas para o ensino público superior, o cidadão oriundo de família de baixa renda acaba por competir em desigualdade de condições com os candidatos cujas famílias têm condições financeiras de custear uma educação no ensino privado. Esta desigualdade se constata de duas formas: primeiro, porque sua competitividade pode ser prejudicada, na medida em que o ensino fundamental em escola pública por vezes não se iguala ao ensino fundamental privado, tornando sua base mais frágil do que de seus potenciais concorrentes e, segundo, porque os candidatos cujas famílias podem pagar pelo ensino privado concorre não somente para as vagas do ensino público, mas também do ensino privado, o que aumenta significativamente sua chance de ingressar e concluir o ensino superior. Desta forma, embora o legislador seja bem intencionado, a efetividade da norma torna-se complexa. Aliás, ilustrativamente, menciona-se a “Proposta de Emenda Constitucional DA FELICIDADE” – PEC 513/2010 que traz a “felicidade” como previsão constitucional, mostrando o quando nosso legislador é pratico com os temas importantes: “Inclui o direito à busca da felicidade como objetivo fundamental da República Federativa do Brasil e direito inerente a cada indivíduo e à sociedade, mediante a dotação, pelo Estado e pela própria sociedade, das adequadas condições de exercício desse direito.” Cita-se o presente exemplo para demonstrar que, embora bem intencionados, por vezes o legislativo acaba por atribuir ao Estado uma demanda impossível de ser suprida. A PEC é a clara demonstração da falta de preocupação, pois se pretende agora a tutelar a felicidade, indo contra o que se mostra o máximo permitido, ou seja, “reserva do possível” a um Estado com recursos com recursos finitos de pouca soma acumulados com a ineficiência e a má fé pública e porque não, privada, nos desvios de recursos. “Em relação aos direitos sociais, é preciso levar em consideração que a prestação devida pelo Estado varia de acordo com a necessidade especifica de cada cidadão. Assim, enquanto o Estado tem a dispor de um valor determinado para arcar com o aparato capaz de garantir a liberdade dos cidadãos universalmente, no caso de um direito social como a saúde, por outro lado deve dispor de valores variáveis em função da necessidade individuais de cada cidadão. Gastar mais recursos com uns do que com outros envolve, portando, a adoção de critérios distributivos para esses recursos.” (MENDES, 2011. p. 668). Exemplos de projetos e leis que visam um direcionamento ao menos não recomendável, infelizmente não são raros, destacando-se regiões de grande miserabilidade. A eficiência Estatal no sentido de efetuar medidas necessárias em especial para a saúde e educação vem sendo historicamente ineficientes e em regra quando veem medidas inovadoras, estas acabam por se mostrar sendo fugazes e defeituosas. Portanto, a dificuldade na efetivação do direito social à educação não esta ausência de amparo legislativo, mas sim em sua implantação. Exemplo disto se verifica com a Lei de Cotas Raciais, sancionado pela presidenta Dilma, pois a garantia do ensino de qualidade é matéria de leis e da própria constituição, independente da cor. Caso houvesse a entrega adequada da educação pública de base, sequer seria necessário se cogitar a hipótese de reserva de vagas seja pelo critério social, seja pelo critério étnico. 3.1 DA (DES)NECESSIDADE DE COTAS PARA AFRODESCENDENTES Para tratar acerca do tema proposto, faz-se necessário abordar acerca da origem da proteção legal que favorece o afrodescendente. Conforme visto, uma defesa usual para os defensores das cotas remonta a origem escravista no Brasil império como termo inicial dos problemas sociais ligados aos afrodescendentes, já que com isto, foram reduzidos à mera propriedade, sem direitos, tendo como único dever o trabalho escravo desprovidos de proteções e vistos como simples mercadoria com valores fixados de acordo a sua condição física. Este tratamento ao homem escravo advém de muito antes de seu uso no Brasil, pois “Em Roma, o trabalho era feito pelos escravos. O Lex Aquilia (284 a. C) considerava o escravo como coisa. Era visto o trabalho como desonroso”. (PINTO, 2011. p. 235) Os escravos sofriam de todo o tipo de violência física, pois como não havia nenhum beneficio para o trabalho escravo, a coação através da violência era utilizada com habitualidade. Além disso, em decorrência do preconceito racial intenso e devastador, somavam-se as agressões a sua moral. Esta escravidão se tornou a principal mão de obra no Brasil sendo que os escravos se tornaram imprescindíveis aos serviços nas minas e plantações, em especial de açúcar e a de café. Com o passar do tempo os negros começaram a se insurgir contra a violência e serviços brutais que desenvolviam, ocorrendo fugas frequentes e, se pegos, a punição tinha o efeito de exemplo aos outros, assim podendo chegar à morte ou mutilação. O negro então era considerado com uma sub-raça ou como descreve Borges (2005) uma “terceira categoria”. O nosso passado histórico, de base escravagista, condenou a população negra a posições desfavoráveis em todas as instâncias da vida social, posto que seja constituída por cidadã (os) de "terceira categoria", ou, como diria Milton Santos, a deficientes cívicos. A situação praticamente inalterada da população negra nos últimos 20 anos aonde não foi, ao longo da história, devidamente acompanhada por políticas capazes de romper o legado discriminatório que ela teve como herança. (BORGES, 2005, p.15) Com o passar dos tempos teve surgimento na Europa um movimento contrario a escravatura que se alastrou para outros continentes, entre eles o Brasil, que se viu coagido a tomar posições igualitárias visto que era altamente dependente do mercado internacional com a Europa. Após muito embate e agressividade entre Estado, Donos de Escravos e Negros, surgiu em 1850 à primeira lei nacional contra a escravidão, a lei Eusébio de Queirós, que passou a tipificar e punir quem trazia escravos para o país, nomeando estes como traficantes de pessoas. Seguindo o mesmo sentido, após 21 anos, foi sancionada a lei do Ventre Livre a qual passou a tratar os filhos dos escravos como livres, colocando em extinção a longo prazo a escravidão, já que proibidos de exportar e não podendo usar as próximas gerações para a atividade de escravidão. Assim a Lei 2040, de 28 de setembro de 1871, previa em seu artigo primeiro: “Art. 1º Os filhos da mulher escrava, que nascerem no Império desde a data desta lei, serão considerados de condição livre”. § 1º Os filhos da mulher escrava ficarão em poder e sob a autoridade dos senhores de suas mães, os quais terão obrigação de criá-los e tratá-los até a idade de oito anos completos. Chegando o filho da escrava a esta idade, o senhor da mãe terá a opção de receber do Estado indenização de 600$000, ou de utilizar-se dos serviços do menor até a idade de 21 anos completos. No primeiro caso o Governo receberá o menor, e lhe dará destino em conformidade da presente lei [...]”. Mas tal atitude não satisfez os movimentos para a abolição que ainda teve em 1885 a Lei dos sexagenários, que concedia liberdade aos maiores de 60 anos. Por fim, em 1888, a escravidão foi abolida no Brasil com a lei Aurea, sendo até esta data o único pais ocidental que mantinha a escravidão. A partir da abolição da escravatura, entra-se numa segunda fase em que o afrodescente até então preso, tratado como mercadoria, visto como propriedade, agora passa a ser livre. Entretanto, esta liberdade vem desacompanhada de qualquer preparo ou condições financeiras para se integrar a sociedade, que se mantinha culturalmente racista. Theodoro descreve esta segunda fase da seguinte forma: A abolição da escravidão colocou a população negra em uma situação de igualdade política e civil em relação aos demais cidadãos. Contudo, como a literatura tem constantemente reafirmado, as possibilidades de inclusão socioeconômica dessa população eram extremamente limitadas. Como será visto a seguir, medidas anteriores ao fim da escravidão haviam colocado a população livre e pobre em uma situação de completa exclusão em termos de acesso a terra. Por sua vez, o acesso à instrução também não fora garantido por políticas públicas, não sendo sequer acolhido como objetivo ou garantia de direitos na Constituição Republicana de 1891. No mercado de trabalho, a entrada massiva de imigrantes europeus deslocava a população negra livre para colocações subalternas. (THEODORO, 2008, p. 32) Com o aumento de mão de obra se viu a diminuição do valor da hora do trabalho e o desemprego alargando ainda mais o ódio racial na época. No mesmo sentido Petronilha Beatriz Gonçalves e Silva ilustram: “A abolição só havia abolido no papel; a lei não determinara medidas concretas, práticas, palpáveis em favor do negro” (2003, p. 153). Longe de qualquer perspectiva de melhora, a margem da sociedade que o descriminava, o afrodescente era tratado com racismo, sendo-lhe oferecido serviços da pior qualidade, sem acesso a educação e politica. Em decorrência desta herança histórica, hoje se observa evidentes alterações no que diz respeito à proteção dos direitos sociais dos afrodescendentes. Assim, tem-se hoje um maior desenvolvimento sobe a questão racial em todos os seguimentos, trazendo por fim a tipicidade penal que considera crime o racismo. Com o intuito de se promover uma compensação pelos seus antepassados, a atual geração de afrodescendentes tem sido beneficiada pelo sistema de cotas, seja para o ingresso em concursos para cargos públicos, seja para o acesso ao ensino superior. O problema é que, conforme observamos anteriormente, a Educação, como direito social, é garantido a todo o cidadão e o sistema de cotas acaba por relativizar este direito a todos os demais que não fazem parte desta etnia. O grande problema de se diplomar uma divida de tempo distante é que a efetivação deste critério seguiria em muitos casos uma busca sem fim. Podemos citar o Brasil colonizado por Portugueses aonde viu suas riquezas sendo transferidas ao dominante, teria então nosso pais direito atuais contra tamanha injustiça, ainda mais, cobraria agora de quem não participou de tamanha injustiça? Este exemplo poderia ser usado para inúmeros casos. Como cobrar uma época historia hoje sendo que os fatos e partes não existem mais, mesmo porque se encontram efetivamente proibidos na Constituição Federal como crime inafiançável qualquer ato de racismo. Entretanto, só se pode considerar reparação as políticas públicas inclusivas, que diminuam ou eliminem por completo qualquer tratamento que promova a segregação ou a diferenciação entre os negros e as demais etnias existentes no Brasil, o que não seria o caso do sistema de cotas, pois visa justamente promover a preconceito. Conforme ROZAS: Ao se analisar a Declaração de Independência e a Declaração de Direitos da Virgínia, o significado da expressão “igualdade de oportunidades” baseava-se no fundamento de que os indivíduos são iguais em face da sua própria condição humana, já que todos são indistintamente aptos a serem sujeitos de direitos e obrigações. Assim, uma das principiais críticas dirigidas às propostas de implementação de políticas de ação afirmativa no Brasil refere-se à suposta “importação” de soluções adotadas em outros contextos, que não seriam necessariamente adequadas ao Brasil. (2009. p. 46). Embora inegável a injustiça histórica, as diferenças culturais entre o Brasil e os Estados Unidos da América demonstram como sendo inadequada a proposta de importação do sistema de cotas lá aplicadas. Enquanto nos EUA ocorreu um sistema de segregação, que impedia a convivência entre brancos e negros, no Brasil acabou ocorrendo uma integração de raças, em decorrência da intensa miscigenação característica mundialmente conhecida, aonde alguns dos principais orgulhos pátrios são reconhecidamente negros, como jogadores de futebol, atores de renome, o carnaval altamente conhecido pela beleza das mulatas e porque não, hoje temos um homem negro no mais grau do judiciário. O racismo institucionalizado na cultura norte-americana que acabou por cultivar bairros inteiros de afrodescendentes ricamente ilustrados em seriados e filmes, enquanto que no Brasil esta mesma ilustração resume-se a favelas, bairros de classe média e nobres, que em nada são influenciadas pela ascendência e sim pela condição social. 3.2 A HIPOSSUFICIÊNCIA DA ATUAL GERAÇÃO DE AFRODESCENDENTES – UM PROBLEMA SOCIOLÓGICO As Cotas Raciais se tornou assunto bastante comentado na atualidade, trazendo publicidade e grandes discussões tanto na sociedade como no poder judiciário. Consideram-se os tempos atuais como a “colheita” de uma luta racial que foi semeada a longa data e cada conquista comemorada de forma vigorosa. Em especial desde a "Marcha Zumbi dos Palmares, contra o Racismo, pela Cidadania e a Vida”, o benefício da população negra por meio de políticas públicas tem ganhado a atenção da sociedade brasileira. O debate tem estado em destaque e envolvido não apenas as iniciativas públicas, mas também a privada. Ainda no Governo Lula, já se fazia referência aos esforços concentrados para promover a igualdade: Há algumas semanas, no plenário da Comissão de Constituição e Justiça, representantes de todos os partidos foram unânimes no reconhecimento de que vivemos tempos novos. Durante a sabatina do Dr. Joaquim Barbosa, indicado pelo presidente Lula para o cargo de Ministro do Supremo Tribunal Federal, todos os senadores inscritos reconheceram que eram protagonistas de um momento histórico diferenciado, de consolidação do processo democrático. Houve quem considerasse a indicação o ato mais importante do governo Lula. "Um ponto de inflexão", afirmou um senador. Um divisor de águas declarou outro. (SILVA, SILVÉRIO, 2003, p. 11). Os debates e discussões sobre a discriminação social tem utilizado o critério racial como fundamento, fazendo uma distinção entre “dois brasis”, um branco e rico e outro pobre e negro. Um moderno e rico outro anacrônico e miserável. O que chama a atenção são os estoques raciais alojados em cada um desses mundos, tão diferentes socialmente ao mesmo tempo tão parecidos do ponto de vista cultural. No primeiro país, temos um povo esmagadoramente branco e amarelo. No segundo, a grande maioria é formada por afro descendentes. (RIBEIRO, 2009. p.09) De acordo com grande parte da doutrina, o passado do país, de base escravagista, acabou por condicionar à população negra a um status social desfavorável, que de acordo com o ensinamento de Milton Santos, deixou-os em condições de deficientes cívicos. A situação praticamente inalterada da população negra nos últimos 20 anos aonde não foi, ao longo da história, devidamente acompanhada por políticas capazes de romper o legado discriminatório que ela teve como herança. (BORGES, 2005, p.15) Conforme visto nos capítulos anteriores, as cotas raciais foram impostos como forma de inclusão da população afrodescendente na educação superior, em especial naquela de Universidades Públicas, pois a educação é tida como um condutor de escala social. Entretanto, vem-se demonstrando ao longo do presente trabalho monográfico uma inadequação do método proposto. Para proteger esta igualdade entre diferentes, uma das ferramentas implantadas são as chamadas ações afirmativas, assim definidas por Lopes: Um conjunto de ações privadas e/ou políticas públicas que tem como objetivo reparar os aspectos discriminatórios que impedem o acesso de pessoas pertencentes a diversos grupos sociais às mais diferentes oportunidades. Um exemplo bem comum pode ser observado em bancos e outros estabelecimentos comerciais que usam filas específicas para idosos e idosas, reconhecendo que não seria justo submetê-los a uma longa espera. Outra experiência já em uso é a política de criação de delegacias policiais especializadas no atendimento a mulheres, pois a falta de um treinamento específico e de uma compreensão dos tipos de crimes que mais vitimam as mulheres influi na incapacidade de oferecer um justo atendimento às vitimas e de efetivar a devida punição dos criminosos. (LOPES, 2006. p. 08) Demonstrou-se que as ações afirmativas existem como forma de compensação (Teoria da Justiça Compensatória), como um método corretivo de danos ocasionados por um passado de discriminação; como uma forma de distribuir as oportunidades de forma equitativa, viabilizando o acesso aos grupos que se encontram em desvantagem (Teoria da Justiça Distributiva); ou como uma forma de garantir o exercício da democracia, com base no pluralismo jurídico e dignidade da pessoal humana (Teoria Mista). Independente da teoria que se adote, a temporalidade é qualidade comum a todas, bem como o fato de se tratar de uma política pública que visa dar efetividade ao Princípio da Isonomia. Para o presente trabalho, importa observar que somente se pode falar em isonomia se as vantagens oferecidas não forem exageradas, a ponto de colocar aquele que se encontrava em desvantagem com uma súbita vantagem excessiva, a ponto de se inverter por completo os polos. Ou seja, garantir ao fraco tantas ferramentas que o coloquem em uma posição de desigualdade por excesso de benefícios, fazendo com que o forte passe a ser o fraco, desequilibrando-se a balança para o lado oposto. Neste sentido: Deveras, a lei não pode atribuir efeitos valorativos, ou depreciativos, a critério especificador, em desconformidade ou contradição com os valores transfundidos no sistema constitucional ou nos padrões ético-sociais acolhidos neste ordenamento. Neste sentido se há de entender a precitada lição de Pimenta Bueno segundo a qual “qualquer especialidade ou prerrogativa que não for fundada só e unicamente em uma razão muito valiosa do bem público, será uma injustiça e poderá ser uma tirania”. (MELLO, 2003, p.42). Assim, para que se possa falar em estrita observância à isonomia, o remédio adotado deve ser na medida certa. No entanto, não é suficiente que o Estado se abstenha de praticar a discriminação em suas leis. Pois cabe a ele favorecer a criação de condições que permita a todos se beneficiar da igualdade de oportunidades. Por isso, é preciso tratar os desiguais de forma desigual, elevando os desfavorecidos ao mesmo patamar de partida dos demais. A questão principal levantada nesta atividade é trazer em tela outro assunto relacionado intimamente com as cotas raciais, mas que traz diferenças com elas, ou seja, a questão social. Mesmo porque para a questão racial já há ferramentas para punir sua discriminação. Neste ponto explicita na obra de Leal. A prática do racismo passa a serem consideradas como crime imprescritível e inafiançável, sujeitando o discriminador as mais severas penas privativas de liberdade – a reclusão. Além disso, a Constituição fixou a proibição de discriminação no trabalho, na educação, na liberdade de crença, no exercício dos direitos culturais ou de qualquer outro direito ou garantia fundamental. (LEAL, 2003. p. 75) Por isto, neste momento importa tratar do conceito da hipossuficiência. Segundo o Novo Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, a palavra hipossuficiente é composta pelos prefixos “hipo” e pelo substantivo “suficiente”, indicando seu significado: “diz-se de, ou pessoa que é economicamente fraca, que não é auto-suficiente”. O prefixo “hipo”, por si, significa “posição inferior”. Segundo o sentido lingüistico da palavra, portanto, a hipossuficiência relaciona-se às próprias condições econômicas da pessoa, situando-a em posição inferior dentro da sociedade. (Souza, 2008) Constata-se neste ponto que em verdade, o polo fragilizado e que merece proteção, no que diz respeito às oportunidades de ascensão social pelos estudos são os hipossuficientes econômicos. O Estado deve deixar de ser passivo e agir para defender os desiguais, no entanto não deve escolher entre os desiguais pela cor ou por dividas éticas históricos, deve acolher o polo fragilizado que justamente necessitam desta proteção indiferente de sua cor de pele. Sobre esta posição ativa do Estado temos a obra de Leal. O Estado não pode mais ser tido como mero espectador, devendo intervir diretamente nas questões sociais e passando de ente de postura negativa (com o simples dever de não invadir a esfera dos direitos individuais constitucionalmente assegurados) o promotor de bens e serviços – devedor de uma prestação positiva como forma de assegurá-los a uma parcela mais abrangente da sociedade, sendo que as categorias sociais desfavorecidas passam a ser beneficiadas por um tratamento diverso (discriminação positiva), de acordo com a ideia de que devem ser tratadas desigualmente em situações desiguais. (LEAL, 2003. p. 34) Neste sentido, demonstra-se no próximo capítulo que a democratização do ensino superior, está em garantir o acesso aos que não tem igualdade de condições de competir pelas vagas no concurso vestibular (pois é na qualidade da hipossuficiência que deve se concentrar o princípio da isonomia, ao tratar do ensino), por ter oportunidade de acesso ao ensino fundamental de qualidade e não simplesmente pela cor da pele. A REAL NECESSIDADE DE PROTEÇÃO PARA A DEMOCRATIZAÇÃO DO ENSINO SUPERIOR Ao tratar sobre a questão das cotas, sejam elas raciais ou sociais, deve-se ter em mente que a intenção primeira de promover a democracia. No caso da educação, contextualizando o que se vem discutindo ao longo do trabalho, a democracia representaria condições de acesso a todos, de forma igualitária, ao ensino superior. Para os defensores das cotas raciais, a democracia iria um pouco além, pois seria a garantia do direito de participação de todos, por meio da promoção da diversidade e do pluralismo. Neste sentido, a crítica residiria no fato de que, muito embora a população brasileira seja composta por uma grande parte de negros, estariam eles excluídos de direitos constitucionalmente garantidos. Haveria no Brasil um sistema marcado pela discriminação racial, gerando com consequência uma exclusão dos negros dos processos democráticos de criação e participação. Neste sentido, a discriminação aconteceria nos próprios bancos escolares do ensino de base, conforme defendido por Santos: “Da mesma sorte, o melhor entendimento do racismo no cotidiano da educação também é condição sine qua non para se arquitetar um novo projeto de educação que possibilite a inserção social igualitária e destravar o potencial intelectual, embotado pelo racismo, de todos(as) os(as) brasileiros(as), independentemente de cor/raça, gênero, renda, entre outras distinções. Tal fato contribuirá para o desenvolvimento de um pensamento comprometido com o anti-racismo, combatente da idéia de inferioridade/superioridade de indivíduos ou de grupos raciais e étnicos, que caminha para a compreensão integral do sujeito e no qual a diversidade humana seja formal e substantivamente respeitada e valorizada.” (SANTOS, 2005b. p. 11) Para Santos (2005b), o racismo, o preconceito e a discriminação racial brasileira estariam presentes nos bancos escolares, acarretando problemas de auto-rejeição e desenvolvimento de baixa autoestima nos indivíduos negros, pois haveria mesmo nos livros didáticos a constante correção da figura do negro com o escravo e do branco como a figura da pessoa bem sucedida. Isso retiraria do estudante afrodescendente o entusiasmo pelos estudos, dificultando no processo de aprendizagem e ocasionando a evasão. Por outro lado, para o aluno branco haveria a sedimentação do equivocado sentimento de superioridade, reforçando a discriminação racial. “Na educação brasileira, a ausência de uma reflexão sobre as relações raciais no planejamento escolar tem impedido a promoção de relações interpessoais respeitáveis e igualitárias entre os agentes sociais que integram o cotidiano da escola. O silêncio sobre o racismo, o preconceito e a discriminação raciais nas diversas instituições educacionais contribui para que as diferenças de fenótipo entre negros e brancos sejam entendidas como desigualdades naturais. Mais do que isso, reproduzem ou constroem os negros como sinônimos de seres inferiores. O silêncio escolar sobre o racismo cotidiano não só impede o florescimento do potencial intelectual de milhares de mentes brilhantes nas escolas brasileiras, tanto de alunos negros quanto de brancos, como também nos embrutece ao longo de nossas vidas, impedindo-nos de sermos seres realmente livres “para ser o que for e ser tudo” – livres dos preconceitos, dos estereótipos, dos estigmas, entre outros males. Portanto, como professores(as) ou cidadãos(ãs) comuns, não podemos mais nos silenciar diante do crime de racismo no cotidiano escolar, em especial se desejamos realmente ser considerados educadores e ser sujeitos de nossa própria história.” (SANTOS, 2005b. p. 11-12) Santos (2005b) conclui que a inclusão do estudo sobre História e Cultura Afro-Brasileira representaria um avanço na direção da democratização do ensino. Neste sentido, seguindo a linha proposta por Santos e outros autores que defendem as cotas raciais, promover a apresentação da figura do negro de forma positiva de extrema importância para o combate ao racismo, não apenas para que sejam respeitados pelas demais etnias, mas para os próprios negros que passam a compreender suas origens e se sintam confiantes. Para auxiliar neste processo de reconstrução histórica da participação do afrodescendente, as ações afirmativas na educação seria a ferramenta adequada para a sua inclusão, garantindo-se uma democracia participativa e plural. De acordo com Tostes, da leitura do contexto que inseriu as ações afirmativas como critério para ingresso dos negros e pardos nas instituições de ensino superior, observar-se-ia que o argumento utilizado pelos políticos e defensores do sistema de cotas seria de que no Brasil existe racismo. Entretanto, descreve que “a ‘ação afirmativa’ significa duas coisas: a institucionalização do racismo e um ataque à propriedade privada.” (TOSTES, p. 2). E vai além, ao afirmar que a ação afirmativa seria defendida por duas categorias de pessoas, os políticos e uma classe de pretensos “intelectuais”. Aqueles, porque assim garantiriam uma boa fatia do eleitorado e estes, porque apoiar a tais políticos garantiria o acesso aos corredores do poder e à mídia, sob a pretensa bandeira de que com tais medidas se estaria possibilitando a ascensão dos negros brasileiros. Mas, em verdade, esta política pública seria um passo na direção da tirania, já que neste caso existe uma imposição do estado, invadindo inclusive o âmbito privado. “Assim, subsidiar um indivíduo porque ele é negro resultará no aparecimento de mais "negros" a clamar por subsídios; subsidiar os pobres levará a mais pobreza; subsidiar os desempregados trará mais desemprego; promover qualquer tipo de redistribuição coercitiva de renda seja dos pobres para os ricos (inflação, protecionismo), seja dos ricos para os pobres (imposto sobre herança, sobre a propriedade, sobre "grandes fortunas"), resultará no empobrecimento de todos; subsidiar políticos, agências "reguladoras", cineastas, setores "estratégicos" da economia, ONGs, pesquisa científica, universidades públicas, bolsa-escola etc. levará a um aumento do número de parasitas e do incentivo à parasitagem; e por que somente os negros? Onde estão os outros "excluídos" pelo "capitalismo selvagem que aí está"? E os índios, as mulheres, os gordos, os tímidos, os "sem-teto", os "sem-terra", os homossexuais etc.? Toda essa engenharia social, é claro, só pode nos levar a uma direção: o colapso.” (TOSTES, p. 4) Portanto, as ações afirmativas, em verdade, estariam fomentando o preconceito e sua utilização estaria ocorrendo de forma completamente distorcida, na medida em que declarar-se negro garantiria uma vantagem sobre outros concorrentes, já que lhe possibilitaria o benefício das cotas. Este fenômeno iria ao encontro de tantas outras distorções ocorridas pela oferta vantagens a supostos grupos fragilizados, sejam quais forem as circunstâncias. Neste particular, ao se observar os argumentos apresentados, conclui-se que em nada eles tocam a questão da democracia. Os fundamentos daqueles que são a favor ou contra as cotas raciais, giram em torno da existência ou inexistência do preconceito no Brasil e a partir de seus entendimentos, forçam uma aproximação de suas conclusões com a medida adequada para garantir o Estado Democrático de Direito. Ora, a democracia não escolhe crença ou cor. É evidente a associação da doutrina que defende as cotas sociais ao negro pobre. Entretanto, a pobreza não está relacionada à cor da pele e sim a um fator econômico. Isto quer dizer que o negro pobre necessita de tutela do Estado tanto quanto o branco pobre ou o amarelo pobre. Muito mais do que uma questão racial, a democratização do ensino está relacionado a um processo de expansão das oportunidades de acesso e permanência nas instituições públicas de ensino superior, o que os críticos e defensores das cotas têm demonstrado estar relacionada a condição financeira. CONCLUSSÃO Após o trabalho de pesquisa direcionado para o sistema de cotas, pode-se chegar a algumas conclusões. A primeira delas é de que realmente existe um débito histórico com os negros que dedicaram suas vidas ao trabalho escravo, mas esta divida não é interna e sim mundial a exemplo da Europa, América do Norte e até mesmo a África em que se vivenciou e nesta ultima ainda se tem noticias presentes da existência imoral de escravidão . Não se pode basear uma injustiça histórica aonde o contexto e as partes que a vivenciaram se alteraram, pois estaria se remediando uma injustiça do passado criando outra atual, no caso, a pessoa humilde em condições semelhantes ou piores que o negro protegido pelas cotas. Além disso, deve-se questionar até onde caberia uma cobrança histórica, visto que quem sofre no presente com a falta de oportunidades em especial em nas faculdades publicas não é o subgrupo de pessoas negras, mas sim um grupo de pessoas humildes que nunca tiveram oportunidade igualitária de acesso social, estes não tem cor. A segunda conclusão é a alteração do núcleo do problema do ensino. Pretende-se resolver a deficiência publica dos ensinos básico e fundamental, mediante o acesso forçado ao ensino público superior. O Estado tem a obrigação de gerar condições para que o cidadão que consome o ensino público tenha acesso ao desenvolvimento pleno e isto não será alcançado criando somente leis, mas sim direcionando recursos, executando e implementando projetos. Simplesmente abrir as portas da faculdade a quem já vem deficiente do ensino médio publico não parece ser a solução mais adequada. Por meio desta proposta, está-se promovendo outro tipo de exclusão talvez ainda mais dolorosa, em que o aluno que vem de um ensino publico ineficiente se deparara na faculdade publica com um grau de dificuldade para a qual não foi preparado. Ocorre o risco da exclusão que advêm da inclusão sem preparo. Defensores do sistema atentos a este problema vem diplomando cursos de captação para aproximar o nível do aluno do ensino médio publico ao aluno do ensino privado, principal usuário das faculdades publicas. Para tanto prometem oportunizar aos alunos egressos via cota cursos de aperfeiçoamento nos finais de semana, como se um curso esporádico resolvessem anos de ensino deficitário imposto ao cidadão. Apesar de bem intencionada, a ideia gira numa ideologia do quase impossível. O acesso ao ensino público superior merece diversas críticas, mas o critério meritório ainda parece ser o mais democrático, pois neste modelo, cabe ao candidato que demonstrar o melhor desempenho os louros da vitória, neste caso representado pela vaga nos bancos universitários. Entretanto, diante da atual realidade tão somente o mérito não é o suficiente, visto que para que o aluno de ensino fundamental advindo de escolas públicas não possui igualdades de condições com aqueles que tem a oportunidade de optar pelo ensino privado. Desta forma, para que o candidato humilde tenha condições de competir com isonomia, que seja ele o beneficiário das ações afirmativas, visto que a pobreza não escolhe cor. Parece ser um equívoco a proposta das cotas raciais, já que o exemplo vivo de que a raça não é critério definidor de exclusão é o Ministro Joaquim Barbosa, futuro presidente do STF, de pai pedreiro e mãe dona de casa, sempre estudou em escolas públicas e em breve ocupará o mais alto cargo do Poder Judiciário brasileiro, mostrando que em muitos casos se é vitima de si mesmo ao se deixar derrotar. Retirar o mérito de um cidadão hábil a conseguir seu acesso com iguais é o que hoje se considera por muitos o racismo inverso positivado pelo Estado, que vê legitimação em separar por cor o maior deficiente. O que se tem observado é que, infelizmente, parte das decisões que vem sendo tomadas tem base no interesse político. Inegavelmente hoje o STF exerce relação próxima com a política, sendo rotineiros ataques entre seus integrantes motivados pela vaidade e relações políticas. Curiosamente as cotas que tinham uma longa espera para julgamento ocorreu em época pré-eleitoral. Ora, embora inegável o romantismo de se ceder tutela baseada num fato histórico a descendentes distantes, fato maior é concretizar uma eventual justiça cometendo outra atual. A reserva de vagas para afrodescendentes nada mais é do que o indicativo pelo Estado de que se trata de uma raça inferior e que sem um privilégio tal como a reserva de vagas, seriam eles incapazes de galgarem seu espaço nos bancos universitários. Entretanto, esta é exatamente a discriminação vedada pela Constituição Federal. Ainda que se diga que se trata de uma discriminação positiva, ainda assim se trata de discriminação. A história tem se encarregado de demonstrar que quando um povo quer, ele tem condições de se reciclar, de superar adversidades e de ser vencedor por seu próprio mérito e esta força de vontade não tem raça. Andou mal o Supremo Tribunal Federal ao julgar constitucional o sistema de cotas tal como proposto pela UNB, já que teve uma visão bastante limitada de um problema que tem dimensões muito maiores do que a diferença de cor de pele. De qualquer forma, a inadequação das cotas raciais é inegável, pois os próprios autores encarregam-se de demonstrar tal situação. Que o ensino público básico e fundamental necessitam melhorar é fato a muito conhecido e já faz parte do senso comum do homem médio. E este tem sido o fator mais prejudicial do acesso ao ensino público superior. Neste sentido, as temporalidades das ações afirmativas viriam ao encontro dos anseios e das necessidades daqueles que precisam da tutela do Estado, pois embora seja uma solução paliativa, o fato é que, enquanto perdurarem as cotas, se tem a esperança de que o Estado se concentrará na formação de base dos alunos do ensino público, para que chequem em igualdade de condições para competir por uma vaga no ensino público superior. O que pesa no discurso é o fato de que os hipossuficientes seriam os pobres, o fato de serem negros pouco, ou em nada interferiria em sua condição, já que o que o impediu de ter uma formação de base adequada foi sua condição econômica e não a cor de sua pele.

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